O olhar de uma angolana sobre o racismo em Portugal

Não há racismo na sociedade portuguesa"?




Por Katssekya Samuel
             Sou uma angolana de pele achocolatada . Digo isso porque existem também muitos luso-angolanos  que são tão angolanos  tanto  como   eu … tal como o músico Teta Lando cantou “o que interessa é a vontade de cada um fazer Angola melhor”. E ainda bem que há angolanos de vários tons de pele. Quando vi as notícias sobre George Floyd nos principais jornais    do mundo, resolvi remeter-me ao silêncio.  Calei-me porque fui invadida por sentimentos de angústia naquele dia cinzento. Fiquei desnorteada diante dos acontecimentos que dilaceravam a minha alma com os gritos daquele homem que disse as suas últimas palavras: “por favor, não consigo respirar”. (Observador, 02 jun 2020, 20:33 ).
                Desmanchei-me em lágrimas.  Tomei um chá de camomila; fiz a minha meditação e fui dormir. Tal como acontece com Michelle Obama, eu fico” exausta” diante de fenómenos de racismo. Verdade seja dita, tive que ganhar muita coragem para não dizer nada naquele momento, pois queria compreender melhor o que se estava a passar em Portugal, e no mundo. A minha exaustão foi minimizada com o mar de manifestações pacíficas, é claro, contra aquele acto hediondo.
             Calei-me também diante de todos fenómenos sociais, de “ódios” corridos na sociedade portuguesa, nomeadamente o caso dos moradores do Bairro da Jamaica e quando o primeiro ministro António Costa foi chamado ao parlamento para falar sobre o acto de violência que tinha ocorrido naquele bairro.  António Costa é um senhor inteligente, descontraído, sensível e mesmo assim  a sociedade portuguesa não  o poupou  com nomes pejorativos.  Quando o caso do Bairro Jamaica estava em discussão  na casa de leis, ele perdeu a estribeira  diante de uma atitude  subtil  de racismo  de uma deputada no parlamento, e respondeu o  seguinte  : Está a olhar para mim... Deve ser pela cor da minha pele que me pergunta se condeno ou não condeno"(JORNAL I25/01/2019 11:40).
              Calei-me também no caso da senhora indefesa que andava numa das camionetas de Lisboa e que foi violentada por um polícia. Neste caso houve dois crimes: racismo e violência contra a mulher.  O nosso objectivo não é   impelir    aos   agentes de segurança pública    de fazerem o seus  trabalhos como manter a paz e tranquilidade da sociedade, aliás,   diga-se de passagem,  é trabalho muito stressante.                                            Quanto a isso não temos dúvidas sobre a importância do trabalho social dos efectivos da polícia. No entanto, isso não   permite  que os agentes policiais maltratem uma pessoa que  não apresente ameaça e que  se encontra imobilizada.  É aí que começa a fronteira entre a manutenção da tranquilidade e o requinte de maldade de um número significativo de policias. Como podemos ver, existem muitos Geoge Floyd em Portugal.  Apesar destes comportamentos de ódio, acredito que haja polícias imparciais e sem problemas de caracter. Diante de tanto infortúnio, penso que chegou o momento para discutirmos o fenómeno sobre racismo que dilacera a alma  das pessoas negras em Portugal e  em Angola. Devo dizer  aqui que   o racismo é um acto de violência  física e psicológica. Diga-se, em abono da verdade, há alguns portugueses que não apresentam comportamentos racistas, porém têm atitudes racistas  que o revelam como,  por exemplo,   quando dizem: todo o negro é pobre; não é inteligente e só podem ter trabalhos precários  e chamam  nomes como “pessoa de cor”.  Essas crenças sem sombra de duvida,  irão dar origem a comportamentos racistas   contra as   pessoas negras.
            Para compreendermos o  requinte do racismo em Portugal, a título de exemplo, no canal Youtube de Mário Machado  este  faz um resumo sobre o caso de George Floyd, dizendo que o mesmo não foi morto pelo polícia, mas  que morreu de  asfixia. É um canal que semeia ódio contra as pessoas negras.  De igual modo no  canal  de Youtube  de João Tilly, o apresentador,  também  tem uma narrativa  de ódio contra os negros, dizendo a Sra. Deputada Joacine Katar Moreira nomes pejorativos.   Confesso que fiquei perplexa ao  ver como os negros e a Sra. deputada são tratados  nos dois canais  de youtube, e não só.  Estes  referem-se aos negros como sendo pessoas preguiçosas, que  não gostam de estudar  e   que    são criminosos .. etc, etc.  100%  dos  internautas dos referidos canais  sugerem mesmo que os negros deviam voltar  para a África.
 Estes comportamentos racistas verificam-se  também no parlamento português  quando uma  pessoa negra,  como  a deputada Joacine Katar Moreira e a Dra. Francisca Van-dunem , ministra da justiça, tomam a palavra para falar sobre os actos de racismo que a população negra sofre em Portugal.  As atitudes de Portugal sobre o fenómeno de racismo permitem-nos inferir que o racismo em   terras lusas é institucional e estrutural.
              O canal de youtube do Sr.   João Tilly, fez-me  perceber porque  que a sociedade Portuguesa  não aceita a  Sra. Joacine   Katar Moreira como deputada pelo facto de ser negra e apresentar perturbações na fala. A meu ver, aquela deputada é uma  mulher inteligente, altiva e bonita. E parece que Portugal não suporta ver uma mulher negra em destaque.  Estes fenómenos sociais que foram ocorrendo permitem conjecturar  de forma transparente que   uma grande parte dos portugueses são racistas.  Estes factos mostram que   os negros em Portugal vivem sobre  um olhar suspeito e preconceituoso.   E  as atitudes racistas de Rui Rio   quando diz com um sorriso seco  e esforçado  de “que não há racismo na sociedade portuguesa”, mostra que se  dependesse dele, Portugal nunca   iria combater o racismo.(Sapo 8 jun 2020 21:32)
Logo, para combatermos o racismo, precisamos em primeiro lugar, aceitar que este fenómeno social existe e que  ele é  um crime de ódio. E, se o racismo é um crime de ódio, por conseguinte, o sistema judicial deve criminalizar os sujeitos com comportamentos racistas ou desviantes com os instrumentos legais para o efeito. Apesar de haver racismo em Portugal, devo admitir que existem indivíduos que não compactuam com estes comportamentos criminosos. Infelizmente, estas pessoas são uma gota no oceano e remetem-se  ao   silêncio .  Para estes indivíduos convido-os a   fazerem das palavras  de Meghan Markle, esposa de príncipe Harry, como suas  dizendo: “Percebi que a única coisa errada era não dizer nada”. É chegado momento de rasgarmos de forma pacífica o silêncio e   deixarmos para trás os paradigmas coloniais.
 Quais são as consequências psicológicas das vítimas de racismo?
 Verdade seja dita, que se as instituições de justiça começarem a policiar qualquer manifestação de racismo na vida social portuguesa contra as pessoas negras, isso irá minimizar os efeitos emocionais provocados pelo racismo como: tristeza, medo, vergonha, angústia, sentimentos de culpa, irritabilidade, revolta, falta de sono e baixa autoestima …et.etc.  Gostaria de referir aqui que se   a vítima de racismo não conseguir lidar com as essas emoções negativas, em casos mais graves, poderá descambar para perturbações psicológicas como: depressão e stress pós-traumático. E se as vítimas de racismo   não tiverem uma boa rede formal e informal de apoio, estes podem refugiar-se ao álcool ,  as   drogas e   alguns chegarão a cometer suicídio.   E neste sentido, subscrevo com muita propriedade, a ideia de que as vítimas de racismo precisam de apoio psicológico. Apesar de vivermos num mundo com tanto ódio, verdade seja dita, gosto me deleitar  no  discurso de Martin Luther King “I HAVE DREAM” acalentando a esperança que o um dia viveremos todos em paz, independentemente da cultura ou da cor da pele.
Fontes consultadas:




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